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Cozinhando para o Estômago


Quem disse que comida que faz bem precisa ser "sem graça"? Fernando Kassab, apresentador do programa Prato Fácil, mostra muita criatividade em suas receitas que harmonizam principalmente com o estômago. Escrito com o apoio da Associação Brasileira de Câncer Gástrico, o livro trás receitas clássicas, novidades e recriações sempre preparadas com a premissa da boa digestão.
Tive o prazer de ser convidado para fazer o projeto gráfico do livro e trabalhar com Fernando Kassab, cuja simpatia conquista qualquer um.
Pra dizer a verdade, antes de ter contato com os originais do livro, pensava que seria mais um livro de receitas de "comida de hospital", como dizia tia Emengarda. Mas o autor mostrou que há sim muito caminho a explorar na gastronomia sem prejudicar a saúde. E como disse Brillat-Savarin, "comer é humano, digerir é divino".

Da colônia à república: yes, nós temos banana!

Pacova ou pacoba é uma designação comum no norte do país para a banana. Este fruto já alimentava os nativos brasileiros quando os portugueses aportaram por aqui. Os primeiros cronistas que narraram o cotidiano do Brasil exaltam em seus textos os “saborosos frutos da pacobeira”. Fruto tipicamente tropical, tornou-se símbolo brasileiro com as interpretações de Carmem Miranda na Broadway.

Lasar Segall - Bananal, 1927
O artista retrata o personagem e a paisagem brasileira em cores vibrantes. Trouxe para o movimento modernista  a vanguarda dos pintores europeus.

A banana é a fruta mais popular do Brasil, consumida tanto como sobremesa quanto como acompanhamento nas refeições. Ocupa apenas 0,87% do total das despesas de alimentação dos brasileiros em geral (daí a expressão “a preço de banana” para referir que algo não custa caro).
Na crença popular, prega-se que a fruta pode auxiliar no tratamento de algumas doenças, tais como: reumatismo, artrites, prisão de ventre, diarréia, desidratação, queimaduras de sol, entre outras.
No vocabulário usual, as referências à banana, como frases, locuções, imagens comparativas, exclamações de protesto e desabafo, são incontáveis e entendidas em todas as classes sociais. É a linguagem popular que constitui o folclore da alimentação brasileira. Usa-se banana para designar “covarde, tolo, amaricado, sempre concordante. Gesto obsceno, de sugestão fálica; por a mão ou o antebraço no sangradouro do outro, oscilando este com a mão fechada. Dar bananas”.
Apesar da máxima “a preço de banana” já não se aplicar para a própria, já que o preço da fruta andou inflacionando nos últimos anos, ela está disponível o ano todo e é um ingrediente saboroso, nutritivo e versátil. Além disso, é um dos carros-chefes da gastronomia brasileira muito apreciada pelos estrangeiros em todas as suas versões. Portanto, podem vir ao Brasil, porque yes, we have bananas!


Antonio Henrique Amaral - Campo de batalha 3, 1973
No fim da década de 1960, a Tropicália tocava nas rádios e as “Bananas”, de Antonio Henrique Amaral, afrontavam a ditadura exaltando no verde e amarelo a nossa brasilidade. A série “Campos de Batalha” trouxe toda essa referência brasileira amarrada, enforcada, cortada e espetada por garfos frios e cinzentos.

Cozinha. Todo brasileiro tem um pé lá...


Almeida Junior - Cozinha caipira, óleo sobre tela, 1895
A técnica da cozinha brasileira é única, é autêntica. Bandeirantes e tropeiros armavam seus fogões durante as viagens que desbravaram o continente e levaram receitas, costumes e práticas de uma região para outra.
Em volta do fogo ou à mesa, o homem confraterniza e se diverte. A comensalidade sempre foi uma forma importante de promover a solidariedade e reforçar laços entre membros de um mesmo grupo.


Desde os primeiros aldeamentos o brasileiro alimentou-se de maneira distinta. Comia-se no chão, sobre esteiras, em qualquer canto da casa. Talheres foram utensílios de luxo que chegaram com a corte de D. João VI, em 1808. O contato com o refinamento trazido pela corte foi fundamental para que os brasileiros pudessem incorporá-lo ao seu dia-a-dia, deixando para trás os hábitos primitivos. A toalha de mesa, o bule, a xícara e o açucareiro aos poucos foram introduzidos à mesa da população, que queria copiar o modo europeu de etiqueta.
Do fogão à mesa, passando pela copa e sala de jantar, esta é a “cozinha brasileira”, onde preparamos e consumimos os alimentos. Esse espaço possui técnicas, costumes e maneiras que identificam regiões e culturas distintas. O Brasil foi brindado por três heranças diferentes que formaram a identidade da nossa cozinha. Como registrou Fernando Kassab e colaboradores no livro Delícias das Sinhás: “Dos portugueses, herdamos os alguidares, caldeirões, potes, tachos de cobre, formas de bolo de diversos formatos, além de enfeites e moldes para recortes de papel para moldar as bandejas de prata ou estanho. Dos índios, as panelas de barro, o pilão, a cabaça e a cuia. Dos africanos, as colheres de pau e peneiras”. Utensílios e métodos de cocção diferentes acabaram se misturando nas mãos das sinhás, mocamas e cunhãs.
A cozinha, que antes era espaço reservado, aos poucos foi ganhando status de living. Hoje em muitas casas é lá que se recebem os amigos para os momentos de descontração. Nas grandes metrópoles os novos empreendimentos imobiliários priorizam espaços considerados gourmets e a cozinha voltou a ser o ambiente mais valorizado nas residências. Por isso, sente-se à mesa com sua família ou com os amigos, repare na arte que existe por trás do mais primitivo gesto humano, o de se alimentar. Então, façamos um brinde: saúde!